Era uma vez uma Crise

CRISE- Do grego -“krisis“- (separação, decisão,). Momento de viragem. Uma fase, uma estado transitório de incertezas e dificuldades, mas também cheio de possibilidades e renovação.

Quando nos referimos a crises é muito provável que os pensamentos que chegam a sua mente seja algo adjetivado como destrutivo, doloroso, pesado e com potencial catastrófico em na sua vida.

Desde muito cedo somos expostos a sistemas de ensinamentos e aprendizados de como encarar e internalizar as situações críticas da vida. E ao longo desses processos de internalização, meio que automatizados e inconscientes, vamos considerando as crises como algo fatalístico, universal e com valor absoluto de destruição. Essa é uma meia-verdade.

O que você faria se um terrorista com uma bomba amarrada em sua cintura batesse em sua porta para negociar, para dialogar uma situação de interesse comum a vocês dois? Já dá para imaginar a reação, não é mesmo? Temos medo, já que na crise não temos controle e a bomba pode ser acionada a qualquer momento e explodir causando estragos irreparáveis. Não importa quem deu inicio ou a razão do surgimento das crises, elas fazem parte. Sim, elas fazem parte. E chegam em momentos, muitas vezes, críticos de nossa vida. É a empresa que quebra, o ente querido que se vai, a doença que paralisa, a separação que desestabiliza a família, a economia que trás escassez de recursos, o sonho de construir família que não se concretiza.

Condicionados a enxergar a vida pelos óculos da reatividade, do imediatismo, e da exclusão, custamos a acreditar que isso (a crise) está realmente acontecendo conosco. A força e a fé na vida parecem sumir como num truque de mágica. O nosso sistema cerebral reptiliano de sobrevivência é ativado: o que fazer? Como fazer para sair da crise? Porque isso está acontecendo comigo justamente agora? O abismo fica a um passo: o desequilíbrio e o desespero.

 

Antes de qualquer postura reativa de resolução da crise sugiro que primeiro limpe as lentes dos óculos. Às vezes é necessário trocá-lo para observar com olhar mais acurado. A vida é uma grande universidade. E cada crise que chega, ainda que você não goste, não deseje, ou não tenha consciência, é um convite á auto-observação e ao aprendizado, ainda que, infelizmente, envolvendo algum nível de dor ou de situações dolorosas. Se possível, comece um trabalho de observação das lentes dos seus óculos diante da vida e aprenda a observar suas crises.

Se tem um lugar privilegiado e propício á experiência da auto- observação é a meditação e escuta terapêutica. Esses anos de trabalho como psicoterapeuta, por meio das trocas terapeuta-consultante, a vida  me presentou com aprendizados profundos e vitais. E um deles é a dinâmica que se esconde por trás das crises e que compartilho agora com você. Toda crise tem uma dinâmica (na maioria das vezes inconsciente) que necessita ser observada e que integra 4 movimentos que considero caminhos e possibilidades reais de superação e ressignificação:

  1. A crise me revela quem eu realmente sou. Não há nada a
  2. Toda crise é uma lição de vida disfarçada.
  • Nenhuma crise é permanente. Ela segue sempre a lei da impermanência da vida. Seja qual for a sua dor, ela também vai
  1. Toda crise se comporta como um pêndulo de perdas e oportunidades simultaneamente.

Quando nos abrimos verdadeiramente para uma postura de crescimento e aprendizado (quando trocamos os óculos) diante das crises que a vida nos trás, podemos escutar o que o universo esta dizendo: “olhe para aquilo que você não controla e não aceita. Veja aquilo que impede você de fluir e ir adiante”. Uma das grandes lições que a vida o tempo todo nos oferta é fato de que aquilo que nos desafia é também o que mais nos prepara. E a base dessa preparação, capaz de fornecer força para superar as situações de crise, está na sua história de vida.

 

Não importa os traumas, abandonos, rejeições, perdas ou cenários sofríveis pelos quais você passou. A sua história é o que mais te prepara para a vida. Quando nos abrimos para essa verdade, em verdade e com verdade, podemos ir desenvolvendo uma compreensão mais inclusiva e menos catastrófica da vida diante das crises, pois o melhor momento para crescer é quando estamos em meio a uma crise.

Considero que o cenário atual é um desses momentos de crise. Nós (planeta) estamos em crise enquanto vivemos o desafio da pandemia por COVID-19. A terra está pedindo para ser vista. O mundo inteiro está em dor neste tempo de solidão, saudades, isolamento obrigatório, perdas. A diferença é que a crise não é só minha. Ela é também do outro. É universal. Não temos  o controle que gostaríamos de ter e nem o poder de cura imediata. Essa verdade precisa ser vista, acolhida e incluída. O vírus existe. Ele faz parte. E Talvez o momento atual esteja nos pedindo isso: inclusão.

Sim. Às vezes a alma cansa e tem vontade de entrar no jogo da desesperança, da autodestruição, do vício, da depressão. Lembra daquele abismo do desespero e da destruição que estão a um passo diante de nós quando estamos em meio a uma crise?

É hora de começar a limpar os óculos e se possível trocá-los. A realidade é outra. É hora de usar a nossa história, não só pessoal, mas como humanidade, para nos lembrar que o nosso papel neste mundo é INCLUIR, fazer a nossa jornada e aprender a AMAR. Para mim, verdadeiramente, a crise causada pelo vírus da COVID-19 nos convida a vivenciar uma das lições mais curativas neste plano: aprender a amar as situações complicadas da vida. Afinal de contas, o amor, na escala nobre dos afetos e das forças de vida , é a vacina com maior potencial de cura.

Por Mauro Sergio da Costa Batista, psicólogo da Clínica Cuidarte