O que é e como lidar com o luto da perda neonatal?

Todos nós acompanhamos com pesar e tristeza a experiência de perda neonatal recentemente do nosso conterrâneo Whindersson Nunes e sua parceira. Nesta semana concedi uma entrevista á TV ASSEMBLEIA-PI abordando a temática e espero, sinceramente, que este post possa te ser útil na compreensão desse processo complexo que é o luto neonatal!

A perda gestacional ou neonatal quebra com aquilo que é esperado pela ordem do ciclo vital, interrompe abruptamente a construção de sonhos e significados e traz um forte impacto para aqueles que estão envolvidos emocionalmente na vivência da concepção de um bebê.

“Perdi o meu bebê. Morreu hoje de manhã na clínica. Não sabemos como aconteceu. Não é possível! É absurdo!”

A dor da perda de uma criança prematuramente se revela como uma das dores mais intensas e profundas que o ser humano atravessa. É uma prova existencial.  Que prova? A prova de uma separação definitiva que nos obriga a reconstruir-nos diante da dor e do amor simultaneamente. Uma travessia registrada pela ambivalência DOR X AMOR. Antes de tudo, a dor é um afeto, o mais autêntico afeto diante da perda de um filho, no caso da perda neonatal.

Um dos maiores estudiosos da psicologia da dor na atualidade, o psicanalista e psiquiatra Juan-David Násio, em sua mais conhecida obra “O livro da dor e do amor”, apresenta a dor como um fenômeno-limite da condição humana sob três aspectos – enquanto afeto, sintoma e perversão.

“A dor [própria do luto] só existe sobre um fundo de amor”, afirma o autor. De fato Freud fala do amor falando da morte: “a pessoa enlutada sabe quem perdeu,
mas não sabe o que perdeu ao perder o seu ser amado”.  Freud não procura saber por que a perda é dolorosa, mas por que o trabalho do luto é doloroso. A Dor do luto não é dor de separação, mas dor de amor. Ora, não é a ausência do outro que dói, são os efeitos em mim dessa ausência. O que é a dor psíquica?  “É a desorientação de alguém que, tendo
perdido um ser querido, perde uma parte de si mesmo”, lembra o psicanalista Násio.

A dor psíquica do luto neonatal pode se resumir em uma equação: um amor grande demais dentro de nós por um ser que não existe mais fora de nós. A dor de amar mais do que tudo este filho, mesmo sabendo-o perdido para sempre, é um sofrimento que pode precisar de tempo para ser ressignificada, reconfigurada e elaborada. Porque a dor demora muito mais tempo do que os familiares e sociedade imagina. É aqui que a ajuda profissional pode fazer toda a diferença enquanto recurso de ajuda ao enlutado.

Como psicólogo já recebi vários casos de enlutados por perda neonatal e sobre isso posso dizer: a dor da perda é um amor imenso aprisionado na ilusão de infinitude, mas que pode se transformar em amor real, humilde e que fortalece a vida de todos, dos que partiram e dos que ficaram.  O luto da perda neonatal  é um longo caminho, que começa com a dor viva da perda de um ser querido (muitas vezes acompanhado de raiva, negação, culpa, revolta, barganha) que aos passos, e com um trabalho pessoal, apoio e acolhimento pode começar a abrir os braços para o amor real, para  a aceitação progressiva e serena até tornar essa experiência em força de vida.

Assim, o luto pode se definir como um lento processo de desamor ilusório em relação ao ser amado, para amá-lo de outra forma, agora, dentro de si e com força de vida e honra a tudo que foi possível, do jeito que foi.

Conclusão: a dor do luto não é dor de separação, mas dor da ligação. Assim, no o luto da perda o trabalho a ser realizado não é o de esquecer ou atacar a dor, mas o de reconfigurar e se abrir para amor. O real. Este é meu convite para quem vive ou já viveu esta travessia.

Este material fez sentido para você? Comente aí, deixe sua contribuição!
Encaminhe esse post para alguém está com dificuldades em atravessar esta experiência, pode ser útil.

 

Por Sérgio Batista, psicólogo da Cuidarte.